quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Pés saudáveis para mostrar no verão - Por Fabio Ravaglia*

A saúde dos pés depende em grande parte da forma como os usamos. Originalmente, o pé humano foi criado para andar descalço. Mas, é claro que, há séculos, por segurança e higiene, isto foi abandonado. Ocorre que a maneira de pisar, o tipo de calçado que usamos e os cuidados que tomamos influenciam na aparência e no bom funcionamento dos pés. Ao entrar em contato com o solo, os pés agem no controle postural, equilíbrio, apoio, impulsão, absorção de impactos e distribuição do peso corpóreo. O pé é uma máquina perfeita de sustentação do corpo, fundamental para promover a sua mobilidade. O verão é a estação das férias e época de deixar os pés à mostra nas praias, piscinas e sandálias, mas alguns cuidados precisam ser tomados para não fazer feio. Explico algumas questões cotidianas que costumam afetar a saúde dos pés e também como impedir que os problemas mais comuns prejudiquem o seu bom funcionamento.

Cuidados diários
Como estão lá embaixo e quase sempre escondidos dentro dos sapatos, os pés geralmente são pouco cuidados. Mas, até mesmo pela sua atribuição de sustentar o corpo, é fundamental mantê-los saudáveis. Lavar e secar muito bem todos os dias é fundamental. Outra dica é usar diariamente um hidratante para evitar ressecamentos e fissuras. Os cremes com ureia ou ácido salicílico deixam os pés macios e diminuem as áreas de pele grossa (hiperqueratose). É mais prático passar o hidratante antes de dormir. A massagem nos pés, ao final do dia, ajuda a restabelecer a circulação e funciona como uma prevenção a cãibras e dores musculares. Após a massagem, coloque as pernas para cima por alguns minutos. Esfoliar também pode ajudar, mas nada de raspar com lâmina de barbear, e, sim, usar uma lixa fina ou sabonetes ou cremes esfoliantes, uma vez por semana. É importante manter os pés sempre secos para evitar o desenvolvimento de micro-organismos, que se aproveitam do calor e da umidade das regiões entre os dedos e plantar para se desenvolverem nas camadas superficiais da pele, causando micoses e provocando coceiras.

A visita mensal ao podólogo pode ajudar a manter a limpeza e o corte adequado de unhas. Em pés saudáveis, a pedicure pode também fazer a manutenção, cortando e lixando as unhas e esfoliando suavemente a pele. Não se deve tirar a cutícula excessivamente porque isso pode levar a fragilidades e inflamação do tecido. A unha deve ser cortada reta, com os cantos arredondados para não encravar.

Pés diabéticos
O diabético deve ter cuidados redobrados com os pés. Por apresentar a circulação sanguínea diminuída, corre mais risco de formação de úlceras, infecções e disfunções motoras. Além disso, o aparecimento de lesões nos nervos pode levar tanto à dor quanto à perda da sensibilidade dos pés, contribuindo para a formação de úlceras plantares e deformidades. Com o passar dos anos, o diabetes tende a acometer os nervos da perna a ponto de interromper a comunicação com o cérebro, causando falta de sensibilidade à dor. Isso significa, por exemplo, que o diabético pode pisar em um caco de vidro, cortar o pé e continuar andando sem se incomodar. A ferida crônica no pé, que o paciente nem percebeu, se agrava e, por causa da debilidade do organismo em reagir, a infecção não regride. Muitas vezes, atinge os ossos. O sangue não circula nos pés e as células de defesa não chegam, abrindo a porta para a gangrena, a morte dos tecidos e, enfim, a amputação. Poucos diabéticos sabem que calos, feridas e deformações nos pés, quando não tratados, podem levar a amputações. Estima-se que a metade das amputações não traumáticas de membros inferiores realizadas nos Estados Unidos sejam decorrentes da doença. Segundo informações da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), aproximadamente 85% dos diabéticos que apresentam feridas crônicas nos pés evoluem para amputação e, destes, metade sofrerá nova amputação entre dois e três anos.

Com prevenção, podem ser evitados os problemas mais frequentes que surgem, principalmente, em pacientes com mais de dez anos de convivência com a doença. Para diabéticos, existem sapatos especiais, macios e com ajustes em diversos pontos, que evitam que os machucados apareçam nos pés e, com eles, as suas possíveis complicações. Sugiro usar sempre calçados confortáveis, que protejam bem os pés e garantam a segurança. Antes de calçar, verifique no interior dos sapatos se não há pedra ou outro objeto que possa machucar. Para as mulheres que gostam de salto, os mais indicados são os saltos quadrados e mais largos, com no máximo três centímetros de altura. Homens e mulheres devem evitar os bicos finos. Chinelos de dedo deixam os pés desprotegidos. As meias ajudam a proteger os pés, mas prefira as sem costura e sem elástico. No inverno, a meia com sola de couro ou silicone é uma opção para manter o pé aquecido dentro de casa. Manter a higiene é fundamental, mas cuidado para não tomar banho com a água quente demais. É importante também examinar os pés diariamente para verificar o aparecimento de bolhas, frieiras, rachaduras etc.

O diabetes atinge cerca de 245 milhões de pessoas no mundo. No Brasil, segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde, há 11 milhões de pessoas com diabetes do tipo 2 (diabetes mellitus). A incidência de diabetes em pessoas com idade avançada é grande. O Ministério da Saúde estima que 17,5% dos brasileiros acima dos 60 anos tenham a doença. Um outro dado alarmante é o de uma pesquisa da Fiocruz, que demonstrou que 75% dos diabéticos não têm controle sobre a doença. Quando diagnosticada, a doença não pode ser ignorada! O paciente precisa fazer a dieta alimentar recomendada, usar os medicamentos receitados pelo médico e adotar novos hábitos, o que inclui atividade física, para manter a qualidade de vida.

Problemas mais comuns que acometem os pés

A lista de infortúnios que podem afetar os pés é grande e vai de traumas, infecções e inflamações a doenças vasculares, metabólicas, neurológicas ou ortopédicas. A pele pode sofrer com infecções causadas por bactérias e fungos. Passo a comentar os problemas mais corriqueiros.

Fissuras
As fissuras são resultado do ressecamento da pele, que perde a elasticidade e se parte. Com a pele aberta, a região fica exposta e úmida, favorecendo a proliferação de fungos. As rachaduras podem causar dor e sangramento. Para evitá-las, use cremes hidratantes e evite deixar os pés ressecados. Não lixe a pele dos pés. Também beba bastante água para hidratar bem o corpo todo.

Pé de atleta (chulé)
Entre as infecções cutâneas causadas por fungos, está o conhecido pé de atleta, nome popular das dermatofitoses que têm preferência pelo dorso ou planta do pé. O fungo é encontrado com facilidade em ambientes como balneáreos, piscinas, ginásios ou banheiros públicos e se alimenta de proteína humana (queratina). A doença contagiosa se manifesta por meio de coceiras, picadas e ardor e causa mau cheiro, espessamento da pele e unhas amareladas e sem brilho. Manter os pés secos e evitar os lugares de risco é aconselhável. Use chinelo para andar em locais públicos com o piso molhado.

Frieira
Inflamação cutânea de cor avermelhada, acompanhada de rachadura dolorida e bolhas, que ocorre entre os dedos e provoca coceira. Seque bem os pés e use talco antifúngico. Procure um dermatologista se houver formação de pus, febre local ou inchaço. A tinha interdigital, conhecida como frieira, é um tipo comum de micose. Se a ação dos fungos no corpo humano não for interrompida, leva ao mau cheiro. O fungo se prolifera com muita facilidade em ambientes úmidos.

Micoses (coceiras)
As micoses são muito comuns no verão, quando as pessoas tendem a transpirar mais e a ter mais contato com água, o que deixa a pele úmida por mais tempo. Elas são causadas por fungos e iniciam-se por uma lesão vermelha; se não forem tratadas, podem tomar conta do pé e destruir as unhas.

Dermatites alérgicas
As dermatites alérgicas são doenças inflamatórias comuns que nos pés são provocadas a partir de uma reação ao contato da pele com a borracha ou o couro dos calçados. Podem causar coceira e descamação nas áreas de contato e podem ser confundidas com micoses. A psoríase se manifesta na forma de lesões em placas descamativas e vermelhas que podem ser muito dolorosas. Deixe de usar os calçados ao perceber a tendência alérgica.

Descamações
A descamação pode ser sintoma de algum problema. Na dúvida, o melhor é consultar um dermatologista para verificar a causa.

Calos
O calo é a formação de uma área dura, grossa e rígida da pele em resposta a repetidos contatos e pressões. As calosidades apresentam três formas clínicas distintas: helomas, tilomas e hiperqueratoses. De uma forma geral, é possível eliminá-las para que a pele adquira o seu aspecto e integridade normais. O podologista pode fazer o tratamento com cremes e órteses digitais (de silicone) ou plantares (palmilhas de diversos materiais). Mas de nada adianta, se a causa não for eliminada: evite os sapatos que pressionam ou ficcionem as áreas atingidas e observe se a causa vem da estrutura óssea que está alterada. Em caso de dúvida, consulte um ortopedista.

Unha preta
A unha preta é causada por um bolha de sangue embaixo da unha. O acúmulo de sangue descolore a unha e pode causar pressão e dor, porém, de modo geral, não dói. Na maioria dos casos a unha acaba caindo. Geralmente, corredores e caminhadores que têm o segundo dedo maior que o dedão são mais suscetíveis a ter a segunda unha machucada. O problema ocorre quando há lesão no dedo provocada por muito treinamento em ladeira, competir demais ou se o tênis é muito pequeno para o pé. Para tratar, é preciso drenar o sangue para remover a pressão e para prevenir, use tênis de corrida que se encaixe adequadamente ao pé. A parte onde ficam os dedos deve ser larga o suficiente e o comprimento do tênis deve permitir que seus dedos não batam contra ele. Deve-se ter um pouco mais de um centímetro de espaço entre o final de seu dedo mais longo (não necessariamente o dedão) e o tênis. Meias anti-bolhas podem ajudar a prevenir a fricção.

Unhas encravadas
Problema comum, costuma aparecer com mais frequência nas unhas dos dedos grandes dos pés. A causa quase sempre é o sapato apertado ou traumatismos. Unha encravada pode ser bastante dolorosa e pode ser mais grave quando acompanhada de infecção. O dermatologista pode ensinar a melhor maneira de cortar os cantos ou lixar as unhas para que parem de encravar e, também, receitar medicamentos para combater a infecção.

Verruga e olho de peixe
Aparentemente inofensivas, as verrugas podem indicar a existência de câncer. As verrugas são lesões cutâneas, ou seja, um tipo de tumor que aparece na pele em decorrência de uma infecção viral. O vírus pemetra na epiderme e faz com que a lesão se apareça e aumente. Existem vários tipos de verrugas, por que há mais de 50 vírus que podem provocá-las. O olho de peixe é uma designação popular para lesões hiperceratóricas, ou seja, qualquer lesão durinha que aparece na região plantar é chamada de olho de peixe, mas na grande maioria das vezes, o chamado olho de peixe é a verruga plantar e se caracteriza por ser uma lesão endurecida, com um pontilhado escuro. Há tratamentos com ácidos e tratamentos cirúrgicos, dependendo de cada caso.

Bolhas
As bolhas são o acúmulo de fluidos entre as camadas interiores e exteriores da pele. Elas raramente são um problema sério, mas podem infeccionar. Entre as causas estão a fricção prolongada entre o pé e a meia ou calçado. Para tratar, a bolha deve ser aberta o mais rapidamente possível. Para fazer isso, limpe a região com álcool ou outra solução anti-séptica; fure-a com uma agulha aquecida no fogo e drene com um fio cirúrgico, sem retirar a pele. Então, cubra a área com uma bandagem adesiva. Dentro de 48 horas a maioria das bolhas seca o suficiente para ser exposta ao ar. Mais uma vez, a prevenção é o melhor caminho! Se você é suscetível a bolhas, procure usar meias de duas camadas ou meias anti-bolhas para minimizar a fricção e umidade (meias feitas de fibras sintéticas respiráveis são boas para manter seu pé seco). Palmilhas de neoprene também podem ajudar a reduzir a fricção em algumas regiões dos pés. Certifique-se de que está usando calçados que se encaixam apropriadamente e que sejam correto dos ponto de vista biomecânico.

Joanete
Joanete é a denominação popular para uma elevação que se forma no osso metatarsiano do primeiro dedo do pé (dedão), parecida com um calosidade. Na verdade, o joanete é uma deformação, uma saliência óssea próxima ao dedão dos pés. Ele costuma provocar constante pressão sobre a articulação dos demais dedos, que com o decorrer do tempo ficam curvos e também salientes. Em desvios mais acentudados dos dedos a dor pode ser intensa. Entre as causas mais frequentes do joanete estão o encurtamento do músculo que faz estender os dedos; o excesso de movimentação do primeiro osso do meio do pé; ou a queda do arco da frente, formado pelos ossos dos pés. Os calçados podem causar joanete, principalmente, nas mulheres devido ao uso de sapatos de bico fino que apertam a região anterior do pé (antepé). O joanete aparece também em populações que não têm o hábito de usar sapatos apertados, mas sabe-se que isto é menos frequente. Outras causas concorrem para o aparecimento do joanete como as artrites reumatóide e gotosa, pés planos (chatos) e pés cavos (altos). O tratamento do joanete pode ser conservador ou cirúrgico, dependendo do grau da deformidade e do desconforto da pessoa. É importante consultar um ortopedista para que ele indique a melhor opção para cada caso.

Gota
A gota é uma doença que surge quando a produção de ácido úrico no organismo aumenta, provocando a formação de cristais que se depositam em várias regiões do corpo. Isso gera uma inflamação intensa nas articulações (artrite), com dor de forte intensidade, seguida de inchaço e vermelhidão. Em seu estado crônico, a doença provoca deformações irreversíveis nas articulações.

Varizes
Doenças cardiovasculares, como varizes, também podem prejudicar os pés. Recomendo o hábito de dormir com os pés um pouco mais elevados. Isto pode ser feito colocando alguma coisa para levantar um pouco o colchão onde os pés costumam ficar (pode usar uma lista telefônica, um tijolo ou um travesseiro); dez centímetros de altura são suficientes.

Fabio Ravaglia*
Médico ortopedista e presidente, desde 2005, do Instituto Ortopedia & Saúde (IOS) – organização não governamental que tem a missão de difundir informações sobre saúde e prevenção a doenças, principalmente aquelas associadas à terceira idade, e que organiza o Projeto Cidadania – Caminhadas com Segurança, evento mensal que incentiva a atividade física e conta com uma feira de saúde aberta à população para a realização de exames gratuitos. O dr. Fabio Ravaglia é membro do corpo clínico externo dos hospitais Albert Einstein, Oswaldo Cruz, Sírio Libanês e Santa Catarina; membro emérito da Academia de Medicina de São Paulo (cadeira 118, patrono Ernesto de Souza Campos) membro titular da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia – Sbot; e diretor-presidente da Arthros Clínica Ortopédica.
O dr. Fabio Ravaglia é graduado pela Escola Paulista de Medicina (Unifesp) com residência médica no Hospital do Servidor Público Estadual, especialização em coluna vertebral pelo Instituto Arnaldo Vieira de Carvalho (Santa Casa de Misericórdia de São Paulo) e mestre em cirurgia pela Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp. Foi o primeiro brasileiro aceito pelo programa do Royal College of Surgeons of England. Atuou como cirurgião ortopédico em hospitais ligados à Universidade de Bristol e fez especialização em cirurgia na Alemanha.

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